domingo, 28 de outubro de 2018

Linhas, fusos e meridianos distintos.


. Para Deleuze e Guattari, os indivíduos ou grupos são atravessados por verdadeiras linhas, fusos e meridianos distintos. Nossa existência é uma espécie de geografia. Somos corpos cartográficos. Assim como os mapas geográficos delimitam e registram territórios políticos, econômicos e culturais, os indivíduos também são registrados e cruzados por linhas. Algumas dessas são traçadas do exterior e não se cruzam, ao contrário, separam-se e demarcam os seus próprios territórios. Outras são produtos do acaso; mas há outras que devemos inventá-las, traçá-las efetivamente na vida. Devemos criar nossas próprias linhas de fuga. Mesmo que para alguns indivíduos ou grupos nunca seja possível construí-las. Outros já as perderam. As linhas de fuga são "uma questão de cartografia. Elas nos compõem, assim como compõem nosso mapa. Elas se transformam e podem mesmo penetrar uma na outra. Rizoma"346 . O desejo escorre para agenciamentos e não há agenciamentos solitários. “Desejar é construir um agenciamento, construir um conjunto, conjunto de uma saia, de um raio de sol (...)”347 . Desejar é desterritorializar para construir sempre outras paisagens. Guattari declara que “torna-se imperativo refundar os eixos de valores, as finalidades fundamentais humanas e das atividades produtivas”348 . É a possibilidade de um engajamento ético, estético e analítico. Para Guattari, uma ecosofia “consistirá, portanto, em desenvolver práticas específicas que tendam a modificar e reinventar maneiras de ser no seio do casal, da família, do contexto urbano, do trabalho”


4 comentários:


  1. No entanto, Guattari procura mostrar que há uma política que se dirige tanto ao desejo do indivíduo quanto ao que se manifesta no campo social mais abrangente. E isso se dá sob duas formas: seja uma micropolítica que vise tanto aos problemas individuais quanto aos problemas sociais, seja uma macropolítica que vise aos mesmos campos (indivíduo, família, problemas de partido, de Estado, etc.). O despotismo que, freqüentemente, reina nas relações conjugais ou familiares, provém do mesmo tipo de agenciamento libidinal daquele existente no campo social. 


  2. Para Guattari, a questão não é construir ligações entre campos já constituídos e separados uns dos outros, mas o problema passa pela criação de novas máquinas teóricas e práticas, capazes de varrer as estratificações e estabelecer condições para um novo exercício do desejo. Ele defende que a expressão do homem no mundo se dá a partir do momento em que ele se singulariza. Nesse processo de singularização, já não há uma hierarquização de sociedade e indivíduo, mas sim a forma e o sentido que este dá a tudo o que lhe rodeia. A expressão do sentido, que o homem dá aos acontecimentos e aos códigos, deve ser, permanentemente, construída. Sendo assim, as


  3. construções e desconstruções são agenciamentos de enunciação que se realizam na coletividade, pois o processo de singularização precisa de interventores. O agenciamento coletivo de enunciação é o conjunto das condições que torna possível que instâncias individuais e/ou coletivas estejam em posição de emergir como território existencial autoreferencial, em adjacência ou em relação de delimitação como uma alteridade e/ou mesma subjetiva”353

  4.  Os agenciamentos coletivos de enunciação produzem seus próprios meios de expressão. Eles trabalham os fluxos do desejo, materiais, sociais, semióticos, entre outros, da mesma forma. Para Guattari, “não mais se tem (...) um sujeito e um objeto e, em terceira posição um meio de expressão (...). O que se tem é um agenciamento coletivo que é, ao mesmo tempo, sujeito, objeto e expressão”354 . Uma outra possibilidade de fazer política, no seio das organizações e das instituições. Guattari não acredita que esses movimentos “revolucionários” partam das instituições, mas defende que é do interior das organizações que podem surgir os movimentos moleculares. Uma igreja não tem interesse em revolução, mas dentro dela podem se iniciar produções de enunciados que não tenham relação com a identidade teológica. Experimentar novas sensibilidades, tudo que é do domínio da ruptura, da surpresa e da angústia, mas também do desejo, da vontade de amar e criar. Escapar dos registros de referência dominantes. Ser vigilante aos arranjos que tentam prever tudo o que possa ser de natureza de uma dissidência do pensamento e do desejo

  5. Primeiramente, é verdade que não se opera a própria criação a partir da ilha deserta, mas a re-criação, não
    o começo, mas o re-começo. Ela é a origem, mas origem segunda. A partir dela tudo recomeça. A ilha é o mínimo necessário para esse recomeço, o material sobrevivente da primeira origem, o núcleo ou o ovo irradiante que deve bastar para re-produzir tudo. (...) A idéia de uma segunda origem dá todo seu sentido à ilha deserta, sobrevivência da ilha santa num mundo que tarda para recomeçar. No ideal do recomeço há algo que precede o próprio começo, que o retoma para aprofundá-lo e recuá-lo no tempo. A ilha deserta é a matéria desse inmemorial ou desse mais profundo

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