O apogeu de Ross Macdonald (1915-1983), autor de ficção policial e de thrillers norte-americano – e também presidente dos Escritores de Mistério da América -, deu-se no início da década de 1950 e no final da década de 1970, quando foi constantemente comparado a Dashiell Hammett e a Raymond Chandler. Este trio chegou a ser apontado como “a trindade sagrada dos escritores de crime americanos“, tendo Paul Newman sido a estrela das adaptações cinematográficas das novelas de Macdonald. Uma recensão a um livro seu no The New York Times sugeriu ainda que Macdonald (cujo verdadeiro nome era Kenneth Millar) terá produzido “as melhores séries de novelas de detective escritas por um americano”.
“Dinheiro Negro” (Alfaguara, 2017) – no original Black money (1966) – é um clássico policial escrito com fina ironia (“Sentei-me numa cadeira de costas altas construída por Torquemada com as suas próprias mãos”), realismo actual e capacidade de gerar no leitor um sistemático interesse e envolvência. Numa narrativa bem pensada, com capítulos sequenciais na acção e muito bem ritmados, “Dinheiro Negro” revela um mundo da alta sociedade sul–californiana dos anos 60, com o “verniz estalado” pela forma convincente como Lew Archer, o detective mais carismático de Los Angeles, vai desvendando a incrível trama, que envolve homicídios, dívidas de jogo, chantagem, cobiça, dinheiro, paixão e sexo.
Lew Archer, homem duro e ousado, com um olho para as mulheres e um certo gosto por licor – inconfundível personagem bem trabalhada ao longo dos muitos livros de mistério escritos por Ross Macdonald -, é contratado por um noivo abandonado da alta sociedade para fazer a investigação sobre a misteriosa fuga da noiva com um professorfrancês muito esquivo. Porém, aquilo que parecia ser um caso de afectos mal geridos e compreendidos, transforma-se numa história que ultrapassa em muito o noivado e na qual ninguém, mas absolutamente ninguém, é quem parece ser.
O autor aprofunda os sentimentos e convicções, escrevendo não apenas sobre as transgressões legais mas também sobre “tristezas“. Lew Archer torna-se lentamente em algo mais profundo: debaixo de um exterior rude eleexiste compaixão. Ao longo de uma série que abrange 18 romances, Lew Archer tornou-se de certa forma paradoxal: um personagem memorável sobre quem o leitor não sabe nada, mas igualmente um bom ouvinte através do qual a trama se desfia. Ross Macdonald queria que o seu detective fosse como um terapeuta, um homem cujas acções “são amplamente direccionadas para juntar as histórias da vida de outras pessoas e descobrir seu significado.” É por causa da profundidade deste autor que um crítico proferiu um dia a seguinte frase: “Ele não escreveu apenas sobre crime; Macdonald escreveu sobre o pecado”. Um clássico da literatura policial que se recomenda vivamente.
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