sábado, 30 de setembro de 2017

Cada coisa a seu tempo. RICARDO REIS

Cada coisa a seu tempo tem seu tempo.
Não florescem no inverno os arvoredos,
Nem pela primavera
Têm branco frio os campos.

À noite, que entra, não pertence, Lídia,
O mesmo ardor que o dia nos pedia.
Com mais sossego amemos
A nossa incerta vida.

À lareira, cansados não da obra
Mas porque a hora é a hora dos cansaços,
Não puxemos a voz
Acima de um segredo,

E casuais, interrompidas, sejam
Nossas palavras de reminiscência
(Não para mais nos serve
A negra ida do Sol) —

Pouco a pouco o passado recordemos
E as histórias contadas no passado
Agora duas vezes
Histórias, que nos falem

Das flores que na nossa infância ida
Com outra consciência nós colhíamos
E sob uma outra espécie
De olhar lançado ao mundo.

E assim, Lídia, à lareira, como estando,
Deuses lares, ali na eternidade,
Como quem compõe roupas
O outrora compúnhamos

Nesse desassossego que o descanso
Nos traz às vidas quando só pensamos
Naquilo que já fomos,
E há só noite lá fora.

Escolha racional.


As questões da cooperação e coordenação na vida política legislativa da América não tem sido tratada com sofisticação analítica o bastante pela tradição da escolha racional, em particular no âmbito da teoria dos jogos . O tratamento canônico da questão da cooperação tem por base o ''dilema  do prisioneiro ''. Esse dilema ilumina a situação em que a ausência de cooperação deixa os indivíduos em uma posição coletivamente sub-ótima ou Pareto-inferior àquela em que poderiam estar se cooperassem . Ao buscar racionalmente a maximização de seus interesses os indivíduos, assim como os senadores democratas,  são levados a essa situação em função da estrutura de ''incentivos'' com que se deparam. Tais indivíduos não cooperam no dilema do prisioneiro porque não confiam no outro (ou nos outros, no caso da variante do jogo com n pessoas ). No dilema do prisioneiro, independentemente do que o outro fizer , o indivíduo racional escolherá não cooperar. (Ou, em termos técnicos, sua estratégia dominante é não cooperar ). A solução oferecida pela teoria dos jogos é dupla. Em jogos repetidos os indivíduos podem estabelecer uma reputação de comportamento cooperativo . Devido à história de seu comportamento cooperativo e racional. Devido à história de seus comportamento , eles adquirem credibilidade para fazerem ''promessas críveis ''. Alternativamente, em um jogo repetido , o indivíduo pode optar por uma estratégia de ''olho por olho, dente por dente '' (tit for tat), escolhendo cooperar se o outro indivíduo cooperou na rodada anterior do jogo (principalmente prestando louváveis serviços jurídicos à nação ) , e retaliando com não-cooperar se o outro assim o fizer. A segundo solução teórica para a questão da credibilidade tem a ver com a limitação da capacidade de um ator renegar compromissos ou promessas . Pode-se tratar da tão conhecida auto-incapacitação Democrata ou de usurpação dessa capacidade por outrem .Justamente esta última questão nos leva às questões centrais do constitucionalismo e da teoria democrática.


Kalki-Maitreya3 de abril de 2017 10:38

Uma resposta distinta é formulada por Przeworski , para quem a democracia representaria uma situação de equilíbrio geral em um jogo de N pessoas em que a estratégia dominante para todos os atores seria de adesão às regras e à ética da escolha racional : ''Equilíbrios e barganhas são os únicos estados do mundo que são viáveis segundo a teoria dos jogos ''. Ou seja os resultados das interações sociais só se mantêm estáveis se os atores os adotam em seu próprio interesse (self-enforcement ) ou se um ator externo assegura seu cumprimento . Esse segundo caso caracteriza os ''contratos ''. No entanto, como assinilar esse autor ''a noção de que a democracia é um contrato social é logicamente incoerente. Contratos são observados porque são exogenamente implementados ; a democracia, por definição , é um sistema no qual ninguém está acima da vontade das partes contratantes ''. Para Przewoski a questão de um agente externo que assegura o cumprimento está relacionado à questão de ''Quem controla os controladores ''. Nesse sentido o cumprimento das regras pode ser self-enforcing se ''o arcabouço institucional for desenhado de tal forma que o Estado não seja um ator externo mas um agente de coalizões de forças políticas''.Essencial para o desenho institucional é a estrutura de ''incentivos '' com que se deparam os atores. A análise 'principal-agente'' oferece dois conceitos básicos essenciais para o desenho institucional : a restrição da participação (participation Constraint )e a restriçao de copatibildade de incentivos (incentive compatibility constraint ).

K.M

Aguardo. RICARDO REIS


Aguardo, equânime, o que não conheço —
Meu futuro e o de tudo.
No fim tudo será silêncio, salvo
Onde o mar banhar nada.

Ponto de partida.


Acredito profundamente no poder de algumas respostas encontradas nas investigações das tendências econômicas atuais de padrões de repetição e evolução que abarcam todo o curso do capitalismo histórico como sistema mundial . Uma vez que ampliamos dessa maneira o horizonte espaço-temporal de nossas observações e conjecturas teóricas , tendências que pareciam inéditas e imprevisíveis começam a afigurar-se familiares. Talvez o ponto de partida de todos aqueles que ,como eu, acreditam na operatividade desse método, seja a famosa afirmação de Fernand Braudel , de que as características essenciais do capitalismo histórico em sua '' longue durée '' foram a flexibilidade e o ecletismo do capital , e não as formas concretas assumidas por ele em diferentes lugares e épocas: ''Permitam-me  enfatizar que aquilo que me parece ser um aspecto essencial da história geral do capitalismo : sua flexibilidade ilimitada, sua capacidade de mudança e de ''adaptação'' . Se há, segundo creio , uma certa unidade no capitalismo, da Itália do século XIII até o Ocidente atual , é aí , acima de tudo , que essa unidade pode ser situada e observada '' (F. Braudel ) .Em certos períodos, inclusive períodos longos, o capitalismo de fato pareceu ''especializar-se '' , como no ´século  XIX , quando ''se deslocou tão espetacularmente para o novo mundo da indústria '' (idem ) . Essa especialização levou ''os historiadores em geral (...) a encararem a indústria como o desabrochamento final , que teria dado ao capitalismo sua ''verdadeira identidade '' . Mas essa se mostrou uma visão de curto prazo : ''Após a explosão inicial da mecanização, o tipo mais avançado de capitalismo retornou ao ecletismo ---- a um indivisibilidade de interesses ----- como se a típica vantagem de estar no alto comando da economia , tanto hoje quanto na época de Jacques Coeur (o magnata do século XIV) , consistisse precisamente em ''não'' ter que estar restrito a uma única opção, em ser eminentemente adaptável e, por conseguinte , não especializado. '' (Braudel )


K.M.

Vai Pelo Cais Fora

Vai pelo cais fora um bulício de chegada próxima,
Começam chegando os primitivos da espera,
Já ao longe o paquete de África se avoluma e esclarece.

Vim aqui para não esperar ninguém,
Para ver os outros esperar,
Para ser os outros todos a esperar,
Para ser a esperança de todos os outros.

Trago um grande cansaço de ser tanta coisa.
Chegam os retardatários do princípio,
E de repente impaciento-me de esperar, de existir, de ser,
Vou-me embora brusco e notável ao porteiro que me fita muito mas rapidamente.

Regresso à cidade como à liberdade.

Vale a pena sentir para ao menos deixar de sentir.

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Canto a García Lorca


Não basta o sopro do vento
Nas oliveiras desertas,
O lamento de água oculta
Nos pátios da Andaluzia.
 

Trago-te o canto poroso,
O lamento consciente
Da palavra à outra palavra
Que fundaste com rigor.
 

O lamento substantivo
Sem ponto de exclamação:
Diverso do rito antigo,
Une a aridez ao fervor,
 

Recordando que soubeste
Defrontar a morte seca
Vinda no gume certeiro
Da espada silenciosa
Fazendo irromper o jacto
 

De vermelho: cor do mito
Criado com a força humana
Em que sonho e realidade
Ajustam seu contraponto.
 

Consolo-me da tua morte.
Que ela nos elucidou
Tua linguagem corporal
Onde el duende é alimentado
Pelo sal da inteligência,
Onde Espanha é calculada
Em número, peso e medida.

Murilo Mendes

El Placer del Texto (fragmento 7)


Placer del texto. Clásicos. Cultura (cuanto más cultura, más grande y diverso será el placer). Inteligencia. Ironía. Delicadeza. Euforia. Maestría. Seguridad: arte de vivir. El placer del texto puede definirse por una práctica (sin ningún riesgo de represión): lugar y tiempo de lectura: casa, provincia, comida cercana, lámpara, familia –allí donde es necesaria–, es decir, a lo lejos o no (Proust en el escritorio perfumado por las flores de iris), etc. Extraordinario refuerzo del yo (por el fantasma); inconsciente acolchado. Este placer puede ser dicho: de aquí proviene la crítica.


Textos de goce. El placer en pedazos; la lengua en pedazos; la cultura en pedazos. Los textos de goce son perversos en tanto están fuera de toda finalidad imaginable, incluso la finalidad del placer (el goce no obliga necesariamente al placer, incluso puede aparentemente aburrir) . Ninguna justificación es posible, nada se reconstituye ni se recupera. El texto de goce es absolutamente intransitivo. Sin embargo la perversión no es suficiente para definir al goce, es su extremo quien puede hacerlo: extremo siempre desplazado, vacío, móvil, imprevisible. Este extremo garantiza el goce: una perversión a medias se embrolla rápidamente en un juego de finalidades subalternas: prestigio, ostentación, rivalidad, discurso, necesidad de mostrarse, etcétera.


(.)


Parece que existiría una mística del Texto. Por el contrario, todo el esfuerzo consiste en materializar el placer del texto, en hacer del texto un objeto de placer como cualquier otro. Es decir: ya sea vinculando el texto de los "placeres" de la vida (una comida, un jardín, un encuentro, una voz, un momento, etc.) al catálogo personal de nuestras sensualidades, o ya sea abriendo mediante el texto la brecha del goce, de la gran pérdida subjetiva, identificando ese texto a los momentos más puros de la perversión, a sus lugares clandestinos. Lo importante es igualar el campo del placer, abolir la falsa oposición entre vida práctica y vida contemplativa. El placer del texto es una reivindicación dirigida justamente contra la separación del texto, pues lo que el texto dice a través de la particularidad de su nombre es la ubicuidad del placer, la atopía del goce.


Idea de un libro (de un texto) donde sería trazada, tejida, de la manera más personal, la relación de todos los goces: los de la "vida" y los del texto donde una misma anamnesis recogería la lectura y la aventura.


Imaginar una estética (si la palabra no está demasiado devaluada) fundada hasta el final (completamente, radicalmente, en todos los sentidos) sobre el placer del consumidor fuese quien fuese, pertenezca a la clase o al grupo que sea, sin consideración de culturas y de lenguajes: las consecuencias serían enormes, tal vez incluso desgarradoras


***



Texto quiere decir Tejido, pero si hasta aquí se ha tomado este tejido como un producto, un velo detrás del cual se encuentra más o menos oculto el sentido (la verdad), nosotros acentuamos ahora la idea generativa de que el texto se hace, se trabaja a través de un entrelazado perpetuo; perdido en ese tejido –esa textura– el sujeto se deshace en él como una araña que se disuelve en las segregaciones constructivas de su tela. Si amásemos los neologismos podríamos definir la teoría del texto como una hifologia (hifos: es el tejido y la tela de la araña).



Aunque la teoría del texto haya específicamente designado la significancia (en el sentido que Julia Kristeva ha dado a esta palabra) como lugar del goce, aunque haya afirmado el valor erótico y crítico de la práctica textual, estas propuestas son a menudo olvidadas, reprimidas, ahogadas. y sin embargo: ¿el materialismo radical hacia el cual tiende la teoría es concebible sin el pensamiento del placer, del goce? ¿Los raras materialistas del pasado –cada uno a su manera–, Epicuro, Diderot, Sade, Fourier, no han sido todos eudemonistas declarados?


Sin embargo el lugar del placer en una teoría del texto no es seguro. Simplemente llega un día en que se siente la urgencia de descentrar un poco la teoría, de desplazar el discurso en tanto el idiolecto que se repite toma consistencia y es conveniente someterlo al sacudón de un cuestionamiento. Como nombre trivial, indigno (¿quién, sin reír, se llamaría hoy hedonista?) puede perturbar el retorno del texto a la moral, a la verdad: a la moral de la verdad: es un indirecto, un "descentrador" si se puede decir, sin el cual la teoría del texto volvería a convertirse en un sistema centrado, una filosofía del sentido.



***



No se puede decir nunca de manera suficiente la fuerza de suspensión del placer: es una verdadera epojé, una detención que fija desde lejos todos los valores admitidos (admitidos por sí mismos). El placer es un neutro (la forma más perversa de lo demoníaco).


(.)


El placer del texto es eso: el valor llevado al rango suntuoso de significante.



***


Roland Barthes

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

The Times. ÁLVARO DE CAMPOS



Sentou-se bêbado à mesa e escreveu um fundo
Do Times, claro, inclassificável, lido,
Supondo (coitado!) que ia ter influência no mundo...
Santo Deus!... E talvez a tenha tido!

Escritura hechizada

Quando ouso pousar os olhos em uma superfície brilhante de neve , dou-me conta de um padrão fixo de mínimas miragens ópticas ---- nódoas de minha vítrea disposição de ânimo semelhante a micróbios congelados --- que sempre flutuam , em geral despercebidos, no campo da minha terceira visão . Esses inorgânicos, ou aliados, também fazem parte das tensões do meu Eu. E todos os bytes casuais de recordações espontâneas também fazem parte do meu Eu, assim como aquela voz repetitiva que , com suas ficções recompostas indefinidamente e suas recordações indistintas, faz-me companhia durante a insônia hiper-ativa e possui uma inteligência tão sedutora que por vezes eu não me nego a ver no meu próprio Eu apenas um pólo X que serve como suporte de todos os fenômenos psíquicos e poéticos do mundo. E eu jamais permaneço indiferente a esses estados , muito pelo contrário , eu os sorvo e os coleciono avidamente, como um vampiro, permanecendo comprometido com eles como um suporte super-consciente e alerta : uma totalidade concreta que contém e suporta suas próprias qualidades. Sinto não ser nada fora da totalidade concreta dos meus estados e ações além de consciência e intento puro , deslizando por um infinito volátil de dados ... nul signe de tailleur : chaque matin de la terre ouvrait ses ailes au bas des marches de la nuit . Sem dúvida (eu pensava ) sou transcendente a todos os estados que unifico, mas não como um X abstrato cuja missão é somente unificar . A totalidade infinita dos estados e ações só se deixa reduzir à um único estado e à uma única ação no samadhi, a identificação suprema da mente com seu princípio criador . Quando assino meu nome , por exemplo , e o tenho feito com frequência em livros e páginas , acho cada vez mais difícil ir além do K ou do K.M. ---- alguma coisa no ritmo do meu ‘’K.M.’’ tradicional impõe-me de repente uma pausa forçada , um congelamento dos meus músculos motores, geralmente no alto do ‘’M’’ , ou ao pé do ‘’K’’ isolado , de modo que a tinta da caneta, se liberada por uma ponta sensível , começa a sangrar , a esboçar uma estrela azul e a vazar do outro lado do papel . Essa hesitação espontânea, quase mística (penso) , no que deveria ser uma assinatura praticada com fluência (ma tombe et mon retour) penso que é também meu Eu . Uma falha que denuncia meu ser profundo, como uma fratura na camada de gelo da Antártida que revela um celeste azul alarmante na parte mais profunda ----- o alicerce rochoso, o pedregulho radioativo, por assim dizer, sob a tênue luz imaterial do meu desempenho literário e filosófico, social e tântrico . Então o Mundo, desse ponto de vista, passa a ser concebido como uma totalidade sintética infinita de todas as coisas ; um Mundo que alcançamos além de nosso contorno imediato como uma vasta existência concreta . Nesse caso , as coisas que nos rodeiam aparecem como o extremo ponto desse Mundo que as sobrepassa e as engloba . E o Eu se torna para os objetos psíquicos aquilo que o Mundo é para as coisas . Mas a ‘’aparição ‘’ do Mundo  no ‘’horizonte das coisas ‘’ é um fenômeno bastante raro, quase uma iluminação e, em caso de um despertar maior, quase uma ‘’iniciação coletiva ‘’ ; mas se necessitam circunstâncias especiais (bastante bem descritas por Heidegger em Sein und zeit ) para que ele se ‘’desvele ‘’ . O Eu , pelo contrário , está sempre no horizonte de nossos estados , cada estado ou ação não podendo ser separado de nosso Eu . E esse caráter duvidoso do Eu, de presença pegajosa , não significa que eu tenha um ‘’Eu verdadeiro’’ (Moi)  cuja existência ignoro , apenas que o Eu intencionado traz em si mesmo o caráter da dubiedade ( e em certos casos, da falsidade). Le sol qui recueille n ´est pas seul à se fendre sous les operátions de la pluie et du vent . Ce qui est précipité , quasi silencieux , se tient aux abords du séisme , avec séches paroles d ´avant-dire , pénétrantes comme le trident de la nuit dans l´iris du regard ... a hipótese metafísica de que o Eu não se comporia de elementos realmente existentes (há dez anos ou um segundo ) tampouco pode ser excluída ; esse poder do Genio Maligno se estende até aqui . Sinto que quando incorporo meus estados de consciência à totalidade concreta do meu Eu , não lhe agrego nada . Isso acontece porque a relação do Eu com suas qualidades, estados e ações , não é uma relação de emanação (como a relação da consciência com os sentimentos ), nem uma relação de atualização (como a realização da qualidade em um estado ) ---- a relação do Eu com suas qualidades, estados e ações é (isso sim ) uma relação de produção poética, de criação . O Eu se dá na produção desses estados, sejam mais ou menos intensos. ‘’Ce qui est précipité, quasi silencieux, se tient aux abors du séisme ‘’. O Eu mantém suas qualidades por uma verdadeira criação contínua . E se por acaso apareço sempre além de cada qualidade minha ou mesmo de todas , é porque meu Eu é como um objeto opaco : seria necessário desnudá-lo infinitamente para privá-lo de toda sua potência ; e no final desse desnudamento, não haveria nada, o Eu teria se desvanecido no Céu da iluminação, e a consciência teria adquirido o boleto de impecabilidade do ser essencial para a vida eterna . A Bíblia , no entanto, fala muito pouco sobre o Céu, afora as meditações extensas de Ezequiel e os vislumbres da cidade cristalina com ruas de ouro no 21 do apocalipse. Os fundadores da fé cristã não ignoravam , mesmo em seu cosmo relativamente ingênuo, a potencialidade de absurdos póstumos ; Jesus havia rechaçado a pergunta dos saduceus sobre as perplexidades da pós-ressurreição dos ‘’casados muitas vezes ‘’ (Marcos 12: 8-27 – Mateus 22:23-33 – Lucas 20 : 27-40 ), e Paulo , ao explicar a seus captores em Cesaréia que Cristo era o primeiro de muitos a erguer-se de entre os mortos , ouve do magistrado romano que muito saber o havia enlouquecido (Atos 26: 23-24 ). Mas a igreja , ao atingir a ortodoxia , passou a insistir, com uma firmeza não menor que a do materialismo moderno , que ‘’o corpo é o Eu ‘’, e deixou-nos com um dogma, a ressurreição dos mortos , que se tornou algo inconcebível na imaginação da degradação evangélica posterior. O Eu é o criador de seus próprios estados e sustenta suas qualidades na existência por uma espécie de espontaneidade conservadora . Obviamente , não se trata de ‘’responsabilidade ‘’ ou ‘’compromisso ‘’ , mas de um processo mágico (sempre com um fundo de ininteligibilidade ) de ''escritura hechizada '' , conduzida visceralmente pelo desejo . Trata-se então de um pseudo-espontaneidade que encontraria seus símbolos convenientes na emergência de uma fonte, de um geiser, etc . Na passagem de si mesmo para outra coisa , o que supõe que a espontaneidade escapa constantemente de si mesma e vira outra coisa . A espontaneidade do Eu , embora não possa existir por si mesma , como um inorgânico, possui porém uma certa independência em relação ao Eu, de modo que o Eu se encontra sempre encoberto pelo que produz , apesar de que , de um certo ponto de vista, ele ''seja '' o que produz . O laço com que o Eu reúne seus estados permanece sendo ''ininteligível ''... digamos : esotérico . Toda tentativa de ser explícito sobre o ''Ponto de Aglutinação '' da consciência estarrece-nos . O ''Eu essencial '' é um punho luminoso do tamanho de uma bola de tênis, flutuando a dois braços de distância na altura das omoplatas. Notre parole , en archipel , vous offre , aprés la douleur et le desástre, des fraises quélle rapporte des landes de la mort , a insi que ses doigts chauds de les avoir cherchéés . Nessa época medicamente engenhosa que já levou a cabo muitas ressurreições práticas reais , os testemunhos daqueles que retornaram do Além , os relatos de suas E.Q.Ms , de túneis irradiantes e e sensação de amor difusivo imaterial , caracterizam-se por um tipo de banalidade de muito mau gosto , quase tão detestáveis quanto as ''canalizações'' e as ''mesas brancas ''. Na verdade , é toda essa pseudo macumba esotérica da internet que autoriza um autêntico nirvani como eu , um Mestre do samadhi , a simular desavergonhadamente o ''romancista ateu '' do racionalismo francês só para incorporar toda essa histeria charlatã de forma humorística. Os cérebros das pessoas deixaram de ser condicionados pela reverência e o temor religioso . Ninguém mais é capaz de imaginar um Segundo Advento que não seja reduzido ao formato do noticiário noturno da televisão . Algo talvez parecido com o que sucedeu com os mestres do estruturalismo : Lévi-Strauss na antropologia ; Lacan na psicanálise ; Foucault na filosofia ; Barthes na linguística-poética. Por um fenômeno tipicamente francês, esses nomes-obras foram captados pela imprensa de massas e pela televisão , de modo que um vasto público familiarizou-se , então , com o jargão desses especialistas ; os rostos dos mestres tornaram-se familiares para os espectadores de televisão e para os leitores dos grandes jornais franceses ; seus seminários tornaram-se grandes acontecimentos mundanos , shows quase tão disputados quando os do show business. O sucesso era tamanho que outras estrelas ascendentes tbm começaram a oferecer shows particulares : Derridá, Deleuze , Kristeva , Todorov , Greimas , Lyotard, Morin ( boa parte do público desses seminários era latino-americano , e os maus momentos por que passavam, sucessiva ou concomitantemente, os países das Américas Central e do Sul naquela época , transformou muitos brasileiros em ''brésiliens '' ---- houve um momento, inclusive , em que muitos desses mestres contavam e comparavam entre si o número de seus respectivos ''brésiliens '' , numa espécie de teste de popularidade . A linguística estrutural de Saussurre e a linguística transformacional de Chomsky  ; o formalismo russo dos anos 1920 e a nova semiótica soviética. A antropologia de lévi-Strauss e a psicanálise de Lacan renovadas pela linguística de Jakobson . As novas teorias da informação e da comunicação permitindo uma nova leitura dos textos literários, assim como dos textos políticos e publicitários. Estruturas. Sistemas.  Signos . Códigos. Processos. Significações. Ben trovate ! , que em pouco tempo isso tudo já se tornara o sonho megalomaníaco de uma decodificação geral dos sistemas e signos ; e como toda manifestação humana é um ''sistema de signos '' (e agora voltamos ao assunto ) imaginou-se então também uma ciência geral da narrativa , que se encaixaria numa ciência geral das artes , que se encaixaria numa ciência geral da linguagem, abarcando tanto a sociedade quanto o inconsciente . Essa mesma ânsia de totalização do pensamento esteve presente no projeto filosófico de Heidegger, enquanto o filósofo alemão adaptava sua terminologia única aos dispositivos do Reich, com Sein und Zeit . De fato (eu pensava ) a consciência projeta sua própria espontaneidade silente no eu para conferir-lhe o poder criador que lhe é absolutamente necessário . É claro que (tudo na vida tem seu preço ) esta espontaneidade , representada e hipostasiada no eu , devém uma espontaneidade bastarda e degradada , que conserva magicamente sua potência criadora ao mesmo tempo que se faz passsiva. E conhecemos bem outros aspectos degradados da espontaneidade consciente . Não citarei mais que um : uma mímica expressiva e fina pode entregar-nos a ''Erlebnis '' de nossa bela interlocutora com todo seu sentido , todos seus matizes , todo seu ruivo frescor . Mas a imagem nos chega espiritualmente degradada pelo fundo passivo da distância.  Ficamos assim rodeados de objetos mágicos que guardamos como uma lembrança da espontaneidade da consciência, mesmo sendo objetos do mundo .  Essa é a principal causa que faz de um indivíduo um ''brujo'' para os outros : esta ligação poética de duas passividades , das quais uma cria espontaneamente a outra ----- não é outro o fundo mesmo de toda ''brujeria'' , o sentido profundo da ''participação '' espectral . E é por isso também que cada um de nós é ''brujo'' de si mesmo cada vez que consideramos nosso Eu ''em jogo '' .

K.M.    

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Estética do vazio.


 Um mundo sonoro inconfundível nos alcança plenamente através das janelas abertas para o verão em Matisse ou das águas efervescentes de Dufy. Todo o silêncio interno do escritor entra subitamente em jogo . E tenho lá minhas dúvidas sobre a extensão medonha de tudo isto : tais mergulhos no vazio , no entanto , são práticas comuns ao zen-budismo , às figurações neoplatônicas e plotinianas da eternidade e aos tropos cabalísticos da reclusão divina e da negatividade . Por mais discrepantes que sejam seus contextos, são todas doutrinas que constituem o pano de fundo da ''estética do vazio '' ( onde o ''mínimo' significa a plenitude de uma liberdade e de uma potencialidade incomensuráveis ) . Isso (aliás ) necessita de mais explicações , e é o assunto mais sério que posso pensar . No mais convincente das soluções arquitetônicas japonesas e em seus arquipélagos de pedra e areia ( a escala real pode ser perturbadoramente minúscula ) , o silêncio se reveste de luz e a luz de silêncio , como nas tentativas análogas da arte moderna de ''tocar o vazio '' . Os conceitos teosóficos e a mística da luz , em último caso neoplatônica ou dionisíaca ,  que preparam e acompanham todas essas tonalidades minimalistas acabariam se estendendo até a arte de um Ad Reinhardt , um Elsworth Kelly  e toda a escola americana dos ''iluminados do vazio '' associada ao noroeste do Pacífico . Mas é numa série de sete telas compostas entre 1931 e 1938-39 que vemos como a maestria de Mondrian para capturar a dinâmica do vazio era mais ascética e absoluta que a dos outros. É só pensar em sua Composição em vermelho de 1931 , seguida um ano mais tarde por Com amarelo e uma linha dupla (no qual os espaços entre as linhas ganham uma intensidade seminal ) . A série que inclui a Composição Azul e Branco de 1935 , a Branco e Vermelho de 1936 e a Composição com azul de 1937 parece constituir uma verdadeira tríade movendo-se em direção às duas dominantes. Há as obra-primas de 1938 : Losango com oito linhas, Vermelho e Composição em Vermelho. Quase anulada ou limitada a uma marginalidade formal , a presença ou o movimento das cores primárias só enfatiza ainda mais toda a brancura de suas áreas centrais . No melhor Mondrian , a impressão que se tem é que justamente o  que não está na tela é o que modela a liberdade controlada mas profundamente fecunda do espaço central . É precisamente a partir da fertilidade muda de todo aquele vazio que surgirão as versões algebricamente representacionais da Broadway e do Boogie-Woogie m suas últimas obras

Post Scriptum


urgência imediata ao vazio em movimento ou aos absolutos da luz ou da sombra -----
intencionalidade em liberdade
o que Aristóteles chamou de ''enteléquia ''
o puro desdobramento da forma potencial
contato com forças generativas
 pré-figuração das modalidades de ser e dizer
capaz igualmente de incorporar possibilidades e insinuações de uma substância nominal e de uma objetividade mimética para a qual os espaços brancos no centro de um Mondrian ou a ''poeira galática'' rumo à compactação num ''preto sobre preto'' de Reinhardt tem assegurado livre acesso.


Post Scriptum 


A investigação do significado dos elementos matemáticos em boa-parte da estética não-objetiva e minimalista é absolutamente fascinante. A hipótese de que a matemática pura , com o zero como fonte originária, realmente possui um lugar garantido no vórtice originário do pré-ser e que seus ''principia'' , além disso, já erma operantes antes do desenvolvimento do limitado intelecto do homem . Descartes , Leibniz e Platão tbm parecem ter intuído com perfeição todo esse paradoxo. A matemática pura pertence ao reino da criação.


K.M.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

VIAGEM





Duas de ÁLVARO DE CAMPOS



Folha a folha lê em mim não sei que sina


Tal como num dia de festa...HOLDERLIN

Tal como num dia de festa, pela manhã sai,
Para ver o campo, o lavrador, quando
Do calor da noite caíram refrescantes raios
Continuamente e já longe ainda ressoa o trovão,
De novo ao seu leito regressa o grande rio
E fresco viceja o solo
E da videira goteja a chuva
Que do céu trouxe alegria e resplandecentes
Ao sol silencioso se erguem as árvores do bosque:
Assim se erguem em propício tempo,
Aqueles que nenhum mestre por inteiro educa, mas aquela
Que é maravilhosa e imensa e de uma leveza envolvente,
A poderosa, a divinamente bela natureza.
Por isso quando ela parece dormir em algumas épocas do ano
No céu ou entre as plantas ou os povos,
O rosto dos poetas também se entristece,
Parecem estar sós, porém sempre estão cheios de pressentimentos.
Pois, pressentindo, ela própria também repousa.
E eis que o dia nasce! Esperei e vi-o aproximar-se,
E para o que vi, sagrada seja a minha palavra.
Pois a própria Natureza, mais antiga do que as eras
E superior aos deuses do ocidente e do oriente,
Acordou agora com o fragor das armas,
E descendo das alturas do Éter até aos abismos
Segundo a firme lei antiga e gerado do sagrado caos,
O entusiamo que tudo cria volta
A fazer-se sentir de modo novo.
E tal como uma chama se acendeu nos olhos do homem
Que projectou coisas sublimes, assim agora
Lavra de novo um fogo nas almas dos poetas
Deflagrado pelos sinais, pelos feitos do mundo.
E o que outrora aconteceu, quase oculto aos sentidos
Apenas agora é revelado,
E aquelas que sorrindo cultivaram o nosso campo,
Assumindo forma de servo, são agoras conhecidas,
As que em si contêm a plenitude da vida, as virtudes dos deuses.
E tu, perguntas por eles? Na canção sopra o teu espírito,
Quando ele brota do sol diurno e da cálida terra
E de borrascas no ar e de outras
Preparadas mais nas profundezas dos tempos
E mais repletas de sentido, e mais perceptíveis,
Se movem entre o Céu e a Terra e entre os povos.
Os pensamentos do espírito a todos comum encontram-se,
Em acalmia final, na alma do poeta,
De tal modo que ela, subitamente atingida, do Infinito
Há muito conhecida, estremece ao recordar-se,
E é-lhe dada a ventura de, inflamada pelo raio sagrado,
Dar à luz o fruto do amor, obra dos deuses e dos homens,
O canto, para que de ambos dê testemunho.
Assim caiu, como dizem os poetas, o raio sobre a casa de Semele,
Quando ela ostensivamente desejou ver o deus
E aquela que o divino feriu, deu à luz
O fruto da trovoada, o Baco sagrado.
Por isso agora bebem os filhos da Terra
Fogo celestial sem qualquer perigo.
Porém a nós compete-nos, ó poetas, permanecer
De cabeça descoberta enquanto passam as trovoadas de Deus,
Segurar nas próprias mãos o próprio raio vindo do Pai
E entregar ao povo, oculta no canto,
A dádiva divina.
Pois se formos apenas de coração puro
Como as crianças, se as nossas mãos forem inocentes,
O raio puro, vindo do Pai, não o queimará
E profundamente abalado, compartilhando a paixão
Do mais forte, o coração permanece mesmo assim firme
Durante as tempestades que do alto se abatem quando o deus se aproxima.
Mas ai de mim! quando de
Ai de mim!
E se logo disser,
Que me aproximei para contemplar os Celestiais,
Eles próprios me lançarão nas profundezas dos vivos,
Como falso sacerdote no escuro, para que eu
Aos que estiverem receptivos cante uma canção de aviso.
Nesse lugar
*


Wie wenn am Feiertage...
Wie wenn am Feiertage, das Feld zu sehn,
Ein Landmann geht, des Morgens, wenn
Aus heißer Nacht die kühlenden Blitze fielen
Die ganze Zeit und fern noch tönet der Donner,
In sein Gestade wieder tritt der Strom,
Und frisch der Boden grünt
Und von des Himmels erfreuendem Regen
Der Weinstock trauft und glänzend
In stiller Sonne stehn die Bäume des Haines:
So stehn sie unter günstiger Witterung,
Sie, die kein Meister allein, die wunderbar
Allgegenwärtig erzieht in leichtem Umfangen
Die mächtige, die göttlichschöne Natur.
Drum wenn zu schlafen sie scheint zu Zeiten des Jahrs
Am Himmel oder unter den Pflanzen oder den Völkern,
So trauert der Dichter Angesicht auch,
Sie scheinen allein zu sein, doch ahnen sie immer.
Denn ahnend ruhet sie selbst auch.
Jetzt aber tagts! Ich harrt und sah es kommen,
Und was ich sah, das Heilige sei mein Wort.
Denn sie, sie selbst, die älter denn die Zeiten
Und über die Götter des Abends und Orients ist,
Die Natur ist jetzt mit Waffenklang erwacht,
Und hoch vom Aether bis zum Abgrund nieder
Nach festem Gesetze, wie einst, aus heiligem Chaos gezeugt,
Fühlt neu die Begeisterung sich,
Die Allerschaffende, wieder.
Und wie im Aug ein Feuer dem Manne glänzt,
Wenn hohes er entwarf, so ist
Von neuem an den Zeichen, den Taten der Welt jetzt
Ein Feuer angezündet in Seelen der Dichter.
Und was zuvor geschah, doch kaum gefühlt,
Ist offenbar erst jetzt,
Und die uns lächelnd den Acker gebauet,
In Knechtsgestalt, sie sind erkannt,
Die Allebendigen, die Kräfte der Götter.
Erfrägst du sie? im Liede wehet ihr Geist,
Wenn es der Sonne des Tags und warmer Erd
Entwächst, und Wettern, die in der Luft, und andern,
Die vorbereiteter in Tiefen der Zeit,
Und deutungsvoller, und vernehmlicher uns
Hinwandeln zwischen Himmel und Erd und unter den Völkern.
Des gemeinsamen Geistes Gedanken sind,
Still endend, in der Seele des Dichters.
Daß schnellbetroffen sie, Unendlichem
Bekannt seit langer Zeit, von Erinnerung
Erbebt, und ihr, von heilgem Strahl entzündet,
Die Frucht in Liebe geboren, der Götter und Menschen Werk,
Der Gesang, damit er beiden zeuge, glückt.
So fiel, wie Dichter sagen, da sie sichtbar
Den Gott zu sehen begehrte, sein Blitz auf Semeles Haus
Und die göttlichgetroffne gebar,
Die Frucht des Gewitters, den heiligen Bacchus.
Und daher trinken himmlisches Feuer jetzt
Die Erdensöhne ohne Gefahr.
Doch uns gebührt es, unter Gottes Gewittern,
Ihr Dichter! mit entblößtem Haupte zu stehen,
Des Vaters Strahl, ihn selbst, mit eigner Hand
Zu fassen und dem Volk ins Lied
Gehüllt die himmlische Gabe zu reichen.
Denn sind nur reinen Herzens,
Wie Kinder, wir, sind schuldlos unsere Hände,
Des Vaters Strahl, der reine, versengt es nicht
Und tieferschüttert, die Leiden des Stärkeren
Mitleidend, bleibt in den hochherstürzenden Stürmen
Des Gottes, wenn er nahet, das Herz doch fest.
Doch weh mir, wenn von
Weh mir!
Und sag ich gleich,
Ich sei genaht, die Himmlischen zu schauen,
Sie selbst, sie werfen mich tief unter die Lebenden,
Den falschen Priester, ins Dunkel, daß ich
Das warnende Lied den Gelehrigen singe,
Dort

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Rezeptivitat des Stoffes.

Não menos que Hegel, o que Holderlin tentou formular foi  a articulação definidora do momento criativo , do contexto temporal e do ponto no tempo no qual o poeta, o Dichter ,  estará pronto para a recepção de sua matéria ( onde Stoff carrega conotações mais específicas de ''motivo estético '' ou ''material ontológico poético '' ) . Será que acabaríamos entregues ao mesmo mundo das cartas de Keats, uma testemunha contemporânea de Holderlin  ???? Sim e não . Leats tbm estava dedicado a identificar o momento e a descrever a circunstância concentrada do surgimento e do florescimento da criação . Mas o testemunho de Keats é essencialmente narrativo . Seu testemunho imagina e encena ; a introspecção que o caracteriza é formada por uma espécie metafórica de psicologia . Holderlin  , numa estratégia típica da análise estética alemã a partir da Kritik der Urteilskraft de Kant , pretende realizar uma generalização sistemática e transformar a experiência em teoria. O espírito humano, afirma Holderlin , é ao mesmo tempo  comum a todos e específico a cada indivíduo (tais dualidades ou aparentes contradições organizaram o argumento de Holderlin numa cadência voluntariamente hegeliana e dialética ) . O espírito está habilitado (hemachtigt) a reproduzir-se em sua própria encarnação pessoal e na de outros. O poético irradia em direção ao interior e ao exterior. O problema é que por meio dessa dinâmica de interiorização  e exteriorização '' die Form des Stoffes identisches bleibt ''. É uma fórmula que deixa claro que nas relações dialéticas entre a criação e a recepção , a forma geradora , que modela o conteúdo , deve continuar resguardando sua identidade integral e originante .  Mas é essa ''conservação de perfeita energia '' que se revela insustentável . O artista ou o poeta perceberá um conflito fundamental (Wiederstreit ) entre a identidade da obra consigo mesma e suas alterações  durante o processo de expressão e recepção . A harmonia e a transformação ( como o ser e o não-ser de Hegel ) não são inseparáveis . Mas é exatamente quando o poeta ou o artista percebe esse conflito no nível mais intenso de seu desequilíbrio, quando essa divisão se torna completamente sensível (fuhlbar) que surge o momento da criatividade . É só nesse instante que o Ditcher está aberto para a Rezeptivitat des Stoffes ( recepção do conteúdo ) . É essa condição de tensão irreconciliável que, a rigor , pode dar forma ao estético . Surpreendentemente, o modelo de Holderlin antecipa ponto a ponto a identificação de Roger Session sobre a fonte da composição musical , que segundo ele consistiria na experiência imediata, para cada compositor, de ''níveis irreconciliáveis de energia '' . Se o GEIST criativo é inesgotável (unendlich ) , o que o relaciona às necessárias limitações de todos os signos articulados e executivos ???? Holderlin define a função a e finalidade da arte como die Vergegenwartung des Unendlichen (a presentificação do ilimitado, muito semelhante à filosofia blakeana do instante ) . Seu problema consiste em descobrir de que forma   o que está em movimento constante , como o pensamento e os processos vitais, pode ser trabalhado como um dado  ''pontual '' (mais uma vez, Punkt é um termo-chave ) . A atividade envolve uma contrariedade criativa, uma ''Entgegensetzung '' . O poeta opta livremente por opor-se aos clamores do não-finito. O que busca é uma mediação entre a identificação indiscriminada da criança com a integridade do mundo ----- recuperando em si as sugestões wordsworthianas do ilimitado ----- e a abstração voluntária que tende a adotar inevitavelmente uma forma expressiva mais limitada do ''momentaneamente eterno ''... Aliás, acredito que apenas René Char, entre todos os poetas modernos depois de Rimbaud e Mallarmé , tenha conseguido se aproximar com êxito  da equivalência metafórica  dessa noção intrincada mas fascinante : ''savait sourire , elle nomme, à la légère , occupe le fourneaou dans l´unité . Comment vivre sans inconnu devant soi ???................?

K.M.

A ciência dos gozos da linguagem, seu '' Kamasutra ''

A esperança é uma memória que deseja ?? O frio lá fora era de 30 negativos ; outro ônibus para o Leste estava parado ao lado do nosso ; um caminhão e muitos carros. O certo é que uma caminhonete amassara um Austin quase às portas de Dickinson ; a idéia da catástrofe natural da neve se propagara por todo o engarrafamento . À parte alguns avanços mínimos, era tão pouco o que se podia fazer além de ler ou sair do ônibus na tempestade para fumar, que as horas acabaram por se sobrepor, por serem sempre a mesma na memória. Afinal, a verdadeira causa do engarrafamento , como ficamos sabendo depois, não fora o acidente, mas uma caminhãozinho que levava máquinas caça-níqueis para Montana. Durante todo aquele tempo , da primeira à última página o DIÁRIO me perseguira, folheando-se nas minhas mãos praticamente sozinho. Enquanto ela dormia, eu mal me movia na poltrona do ônibus, com meus garranchos diante dos olhos : o que era aquela teoria que (eu me perguntava) pretendendo conceituar a escritura, era ela mesma um discurso escritural ? ----- A escritura é isso mesmo (eu disse quando ela acordou )  A ciência dos gozos da linguagem, seu '' Kamasutra '' (.) ----, e ela riu . De fato :e imensos obstáculos sempre cercavam os grandes prazeres da língua, e mais ainda seus gozos instantâneos ---- novamente a ''filosofia do instante '' blakeana . O trânsito seguia interrompido pelos caça-níqueis de Montana, tão desnecessário nas estepes de Dakota. ---- A própria escritura como inimiga N 1 da Doxa, ou Opinião Dominante (conceito de Barthes colhido em Brecht ) ; seu campo só pode ser o do paradoxo, naturalmente ; e como a Doxa está sempre recuperando as posições paradoxais , é necessário seguir se deslocando como Jack London ou Rimbaud, levando o discurso a exercer sua função crítica e utópica. Nenhuma repetição de receitas para recolocar a Roda do Dharma em movimento : o próprio impulso de nossa consciência, aproveitado iniciáticamente, nos leva ao ABERTO DO MUNDO onde o único valor estável parece ser mesmo essa linguagem indireta, telepática, auto-referencial e auto-suficiente que caracteriza o texto poético moderno (.) -----, eu disse. A linguagem dos anjos ou dos pássaros dos estados de consciência mais elevados eram bem mais do que isso, mas eram também isso, e a partir disso. Aquele era o método mundano com o qual se forjava ''al dente'' um novo órgão verbal com que sondar o mundo. Por isso, eu me sentia na posse do fruto mais refinado de toda a tradição poética moderna, ao transformá-lo em veículo particular de comunicação com o mundo. Esse verbo (eu pensava) sempre seria capaz de resumir minhas sensações mais raras, de fertilizá-las até criar aquela outra vida dramática dentro da minha própria, que durante as sucessivas iniciações exigiria de mim exorbitantes dissipações mentais. A mesma idéia do Verbo Divino de Rimbaud, o verbo de diamante eternamente polido pela tradição crítica moderna.  A Guerra, o Poder, as Artes eram corrupções colocadas tão longe do alcance humano, tão em suas profundezas quanto a devassidão. Mas, desde que o homem se lançasse ao ataque dos mistérios espirituais, ele já não entrava em outro nível de consciência ?? ----- A guerra é a orgia do sangue (eu disse ) e a política a dos interesses (.) Todos os excessos são irmãos . As monstruosidades sociais possuem a força dos abismos ; elas nos atraem, como Santa Helena chamava Napoleão ; elas dão-nos vertigem ; elas fascinam e nós queremos chegas às suas profundezas mesmo sem saber porquê (.) É a idéia do infinito o que se esconde nesses precipícios do Inconsciente Coletivo, e a do estilo com que está revestido o conteúdo que, em cada caso, alcança a superfície da realidade, a distinção tradicional de forma e fundo . Um bom estilista ainda é aquele que escreve bem , que domina múltiplos recursos e comunica com habilidade estratégica a graça de suas idéias e das idéias alheias. Por isso escritura não é só expressão ---- é uma linguagem enviesada que , pretextando falar do mundo, remete sempre a si mesma como referente e como forma particular de refratar o mundo. A escritura questiona o mundo sem se preocupar em oferecer repostas, e por isso mesmo oferecendo-as intuitivamente ; os acordes psíquicos que a escritura toca liberam a significação , como um choque de espreita, mas não fixam nenhum sentido. Nestas circunstâncias, o sujeito que fala não é pré-existente ou pré-pensante, não está centrado num lugar seguro de enunciação, como o escriba anestesiado pela Doxa, mas produz-se, no próprio texto , em instâncias sempre provisórias, como uma substância desconhecida e extremamente volátil cujo manejo requer uma incrível intensidade de concentração. Um modo de dizer as coisas, uma enunciação, uma voz. E esse modo de dizer provém do mais íntimo e único de cada escritor : do seu corpo , do seu inconsciente, de suas recapitulações pessoais , do mar escuro do seu ser . ----- Minha escrita é o termo de uma metamorfose cega e obstinada, partido de uma infra-linguagem que se elabora no limite da carne e do mundo, à medida que é expandida pela aquisição progressiva do nirvana. É o nirvana, ou o plasma, esse fogo consciencial que substitui, na consciência do escritor iniciado, as idéias e os pensamentos por idéias-palavras, pensamentos-palavras e palavras-valise e objetos parciais despedaçados dentro da mente onde a forma não mais exprime , mas ''faz '' o conteúdo. E essa escritura não se presta à análise tópica, como desejariam as velhas sentinelas críticas da Doxa. Podemos mostrar as técnicas que fazem um bom estilista, mas não podemos isolar aquilo que transforma um bom estilo numa autêntica escritura poética moderna. A capacidade  de infiltrar-se e apropriar-se de qualquer discurso camaleônicamente, como um vírus editorial ?? Não existem aspectos secundários no método operativo do plasma, ele é uma substância viva atuando no texto. Por isso a escritura é essa ''rajada forte de enunciação ''. Um texto é realmente escritural quando nele ouvimos a voz única de um corpo, e a recebemos como um gozo : e o gozo não é analisável, nem recuperável por qualquer tipo de meta-linguagem .Ele é sentido como intensidade psíquica, como perda do sujeito pensante e ganho de uma nova percepção das coisas. 

K.M.

Natureza essencialmente colaborativa

A Poíesis possui uma natureza essencialmente colaborativa, sobretudo naqueles aspectos que comprovam a dialética entre as forças políticas e econômicas de nosso presente. Daí que até etimologicamente esse termo grego signifique ''produção'' ou ''fabrico'' . Mas na verdade, o que pretendo apontar são as presenças eleitas que tantos criadores  constroem em si  próprios ou no interior de suas obras, os companheiros de viagem, professores, críticos , parceiros dialéticos e autoridades , e todas aquelas outras vozes que murmuram sob as suas, e que são capazes de conferir até ao mais complexamente solitário e inovador dos atos criativos a experiência de uma trama compartilhada e coletiva. 


K.M.

De ramas que se tejen y entretejen


que meus versos anodynos engeita


O desafio da integração vertical.


Como previra Adam Smith um século antes , a intensificação das pressões competitivas inerentes ao processo de liberalização do comércio resultou na limitação dos lucros a um nível apenas ''tolerável ''. O fato de o resultado ter sido previsto não foi grande consolo para os empresários que viviam do lucro e para o lucro . E, quanto mais feroz a competição , mais eles se esforçavam por colocá-la sob controle . Como escreveu Edward S. Meade , referindo-se especificamente aos industriais norte-americanos, os empresários ''estavam cansados de trabalhar para o público ''.  ''eles querem um lucro maior, sem uma luta tão desesperada para obtê-lo '' (citado em Sklar ). Um reforço óbvio nesse esforço foi a combinação horizontal ----- a fusão de empresas , através da associação , , incorporação ou assunção do controle , usando os mesmos insumos para fazer os mesmos produtos para os mesmos mercados . Através desses tipos de combinações, as empresas concorrentes podiam reduzir umas para as outras as incertezas do mercado ; podiam colocar sua produção, suas compras e vendas conjuntas em níveis que garantissem  lucros maiores ; e podiam unir seus recursos para penetrar em mercados não regulados , desenvolver novas tecnologias e organizar suas operações de maneira mais eficiente . As fusões horizontais , no entanto, não  eram fáceis de implementar  em mercados superlotados ---- ou seja, exatamente onde eram mais necessárias ----, especialmente sem apoio dos governos . Um meio mais direto ---- porém, quando viável , mais eficaz de pôr a concorrência sob controle ----- era a integração vertical, a fusão das operações de uma empreasa com as de fornecedores e clientes ,de modo a garantir suprimentos ''ascendentes'' para a produção primária e escoamento ''descendentes '' para consumo final . As empresas de unidades múltiplas que resultavam dessa fusão ficavam em condições de reduzir os custos de transação , os riscos e as incertezas envolvidos na movimentação de insumos-produção pelos sub-processos sequenciais de produção e troca que ligavam a obtenção de insumos primários ao escoamento do produto final . ''Tornando-se rotineiras as transações entre as unidades, reduziam-se os custos das transações. Mediante a ligação da administração das unidades produtoras com as unidades de compra e distribuição, reduziam-se os custos da informação sobre mercados e fontes de abastecimento. Muito mais importante que isso, o planejamento mais eficaz dos fluxos gerava um uso mais intensivo das instalações e do pessoal empregado no processo de produção e distribuição, aumentando a produtividade e reduzindo os custos . Além disso , a coordenação administrativa proporcionava um fluxo de caixa mais seguro e um pagamento mais rápido pelos serviços prestados '' (Chandler ). A medida que os fluxos de caixa grandes e regulares , assegurados por esse tipo de centralização, foram reaplicados na criação de hierarquias de executivos de níveis alto e médio, especializados na monitoração e regulação dos mercados  e dos processos de trabalho , as empresas verticalmente integradas obtiveram vantagens competitivas decisivas, se comparadas às empresas de uma só unidade ou às empresas de muitas unidades e menos especializadas . ''Uma vez criadas , essas hierarquias tornaram-se uma barreira  muito mais sólida do que a tecnologia contra novos ingressos nas indústrias bem reorganizadas pela integração vertical '' (Chandler ) .  As tendências para a fusão horizontal e a integração vertical , acionadas pela competição intensa , generalizada e persistente dos últimos 25  anos do século XIX, desenvolveram-se de modo muito desigual  entre as comunidades empresariais dos três principais países industrializados da época : Grã-Bretanha , Estados Unidos e Alemanha . A comunidade empresarial alemã foi a que se moveu com maior rapidez e sucesso nas duas direções, dando origem ao sistema coeso de empresas comerciais que , tempos depois , Rudolf Hilferding transformou no modelo do ''capitalismo organizado ''. A comunidade empresarial britânica , em contraste, moveu-se com extrema lentidão  e pouquíssimo sucesso em qualquer das duas direções , particularmente na era da integração vertical . ''Por último, a comunidade empresarial norte-americana ficou mais ou menos a meio caminho , obtendo menos êxito do que a alemã em suas primeiras tentativas de se mover em direção às fusões horizontais , mas acabando por despontar como a mais bem-sucedida de todas na prática da integração vertical '' (Chandler ) . O padrão germânico inseriu-se inteiramente nas atividades diplomáticas e bélicas do recém-criado Reich alemão . As complicações econômicas históricas do período obrigaram o Chanceler Bismarck a intervir para proteger a sociedade alemã, de modo a ipedir que os estragos da competição irrestrita de mercado destruíssem o edifício imperial que ele acabara de construir. Ao mesmo tempo , ''a crescente convergência dos interesses agrários e industriais , que pressionavam pela proteção do governo  contra a concorrência estrangeira , deu a Bismarck algumas oportunidades singulares de usar o poder político investido no Executivo do Reich ''para garantir um novo equilíbrio de poder entre o Reich e os Estados e completar a unificação nacional , cimentando-a com laços econômicos indissolúveis '' (Rosenberg ). Ao cimentar a unidade de economia alemã e dotar o Estado alemão de um poderoso aparato militar-industrial , o governo alemão buscou ativamente a ajuda de empresas que estavam na vanguarda da industrialização progressiva da guerra e, acima de tudo,  a de seis grandes bancos . ''Esses Grosbanken haviam surgido da estrutura pessoal e interfamiliar da atividade bancária alemã , que ainda prevalecia na década de 1850 , primordialmente através da promoção e financiamento de empresas ferroviárias e firmas da indústria pesada envolvidas na construção de ferrovias'' (Tilly) Sua dominação sobre as finanças alemãs aumentou ainda mais durante a depressão da década de 1870 . ''Quando uma grande proporção de seus recursos empresariais e monetários foi liberada pela nacionalização das ferrovias, na década de 1880 , eles agiram com rapidez no sentido de controlar , integrar e reorganizar a indústria alemã , em conluio com um pequeno número de firmas industriais poderosas '' (Henderson ) . A economia interna alemã, na famosa frase de Engels , começava a se parecer a uma ''grande fábrica '' . Em nítido contraste com a Alemanha, na Grã-Bretanha ''havia pouco movimento no sentido de diferenciar a administração e a propriedade, e no sentido de alongar as hierarquias organizacionais . ''. (idem ) . Todo o sistema britânico de empresas comerciais estava aprisionado em determinada via de desenvolvimento, a qual ''não conseguia abandonar, a não ser a um custo que ultrapassava em muito os benefícios calculáveis '' (Ingham ) . Tratava-se da via de um sistema econômico voltado para fora, que trazia suas matérias-primas do mundo inteiro e dependia crucialmente de pontos de venda externos para escoar lucrativamente sua produção industrial . A especialização adicional em uma rede global de comércio não foi a única nem a principal resposta dos empresários britânicos à intensificação das pressões competitivas decorrentes da expansão do comércio mundial  em meados do século XIX. O redirecionamento dos fluxos de caixa ---- da produção voltada para a agiotagem da especulação e do investimento interno para o externo --- foi muito mais importante para determinar o eventual desfecho da crise icipiente do sistema britânico de empresas comerciais . Mas gostaria de frisar que esse sistema não gerou , a partir de seu núcleo nacional , a tendência para a integração vertical dos subprocessos de produção e intercâmbio que viria a se tornar a característica  dominante da organização empresarial  no século XX . Assim como a passagem da forma associativa para a da empresa familiar, no fim do século XVIII e início do XIX , tinha estado estreitamente relacionada com um deslocamento espacial do epicentro dos processos sistêmicos de acumulação de capital , que saíra das Províncias Unidas para o Reino Unido , tbm a passagem da forma da empresa familiar para as corporações, no fim do século XIX e início do XX , esteve estreitamente ligada a uma deslocamento espacial análogo do Reino Unido para os Estados Unidos. Foi nos Estados Unidos que a tendência para a integração vertical se desenvolveu de maneira mais plena e com maior sucesso. A tentativa de controlar as pressões competitivas do fim do século XIX fez os Estados Unidos seguirem a mesma direção da Alemanha, ou seja, a caminharem para formar fusões horizontais , restringindo a concorrência e ampliando a dominação de um pequeno grupo de instituições financeiras privadas que haviam crescido através de investimentos em companhias ferroviárias e empresas industriais correlatas. ''Nos Estados Unidos,  porém , a maioria dessas associações nacionais havia deixado de atingir seus objetivos muito antes de elas serem declaradas ilegais, em 1890, pela Lei Anti-truste de Sherman . E a dominação das instituições financeiras nunca foi muito além da construção e operação de sistemas ferroviários '' (Chandler ).Nas décadas de 1880 e 1890, a mudança nas estruturas das empresas alemãs e norte-americanas começou a divergir radicalmente. Em ambos os países, a centralização do capital ganhou impulso . Na Alemanha, as oportunidades de buscar a integração vertical esgotaram-se com rapidez, e o principal impulso de centralização do capital deu-se nas fusões horizontais '' (Landes ) . Nos Estados Unidos, ao contrário ,o grande impulso da centralização do capital  passou a ser a integração vertical. como frisou ainda Alfred Chandler , as fusões  horizontais --- ineficientes , impopulares e , a partir de certos momentos, ilegais  ---- foram abandonadas . As firmas comerciais, de ramos que iam dos cigarros e da carne enlatada  até equipamento de escritório e máquinas agrícolas, procuraram integrar em seus campos  organizacionais os subprocessos sequenciais da produção e do intercâmbio .  Todas as fases, desde a obtenção de insumos primários até o escoamento dos produtos finais , foram interligadas em uma única empresa. A maior velocidade com que os insumos primários podiam ser transformados em produtos finais pelas empresas verticalmente integradas permitiu que essas empresas reduzissem os custos e aumentassem a produção por trabalhador e por máquina , em um ritmo mais rápido e em maior grau do que as empresas de uma só unidade ou as empresas de muitas unidades e menos especializadas. A medida que os grandes e regulares fluxos de caixa gerados por essas ''economias de velocidade '' foram reinvestidos na criação de hierarquias de executivos de níveis alto e médio , especializados na monitoração e na regulação de mercados e processos de trabalho , as vantagens competitivas das empresas verticalmente integradass aumentaram ainda mais. O resultado foi um crescimento e disseminação  rápidos da nova estrutura organizacional . ''Essas empresas integradas passaram a dominar muitas das indústrias norte-americanas mais vitais em menos de três décadas '' (Chandler )  . ''O crescimento não se restringiu ao mercado interno norte-americano . As empresas  dos Estados Unidos tornaram-se multinacionais quase imediatamente depois de concluir sua integração continental'' ( Hymer ) . Em 1902, os europeus já falavam em uma ''invasão americana '' e, em 1914 , os investimentos diretos norte-americanos no exterior corresponderam a 7 % do PIB dos Estados Unidos. A mesma porcentagem de 1966 , quando os europeus voltaram a se sentir ameaçados pelo ''desafio americano '' (Wilkins ).

K.M. 

Ó caminho de vida nunca certo,

O recado que trazem é de amigos, 
Mas debaixo o veneno vem coberto, 
Que os pensamentos eram de inimigos, 
Segundo foi o engano descoberto. 
Ó grandes e gravíssimos perigos, 
Ó caminho de vida nunca certo, 
Que aonde a gente põe sua esperança 
Tenha a vida tão pouca segurança!

No mar tanta tormenta e tanto dano, 

Tantas vezes a morte apercebida!
 Na terra tanta guerra, tanto engano, 
Tanta necessidade avorrecida! 
Onde pode acolher-se um fraco humano, 
Onde terá segura a curta vida, 
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
 Contra um bicho da terra tão pequeno?

Os Lusíadas