domingo, 16 de setembro de 2018

BEING BEAUTEOUS



Devant une neige un Etre de Beauté de haute taille. Des sifflements de mort et des cercles de musique sourde font monter, s'élargir et trembler comme un spectre ce corps adoré ; des blessures écarlates et noires éclatent dans les chairs superbes. Les couleurs propres de la vie se foncent, dansent, et se dégagent autour de la Vision, sur le chantier. Et les frissons s'élèvent et grondent et la saveur forcenée de ces effets se chargeant avec les sifflements mortels et les rauques musiques que le monde, loin derrière nous, lance sur notre mère de beauté, - elle recule, elle se dresse. Oh ! nos os sont revêtus d'un nouveau corps amoureux.
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O la face cendrée, l'écusson de crin, les bras de cristal ! le canon sur lequel je dois m'abattre à travers la mêlée des arbres et de l'air léger !

BEING BEAUTEOUS

Diante de uma neve, um Ser de Beleza de alto talhe. Sibilações de morte e os círculos de música surda levitam seu corpo adorado, e ele se expande e treme como um espectro; feridas escarlates e negras rebentam nas carnes soberbas. As cores próprias da vida ficam foscas, dançam e se desatam ao redor da Visão, sobre o estaleiro. E os frissons se elevam e rugem, e o sabor delirante desses efeitos se estocam com as sibilações de morte e as músicas roucas que o mundo, ao nosso encalço, lança sobre nossa mãe de beleza,

- ela levanta, ela recua. Oh! nossos ossos revestidos por um novo corpo de amor.

***

Ó a face cinza, escudo de crina, braços de cristal! O canhão de que me atiro nessa briga das árvores com a brisa!
(.)
BB

Against the snow of Being a high-statured Beauty. Whistlings of death and circles of secret music make the adored body, like a specter, rise, expand, and quiver; wounds of black and scarlet burst in the superb flesh. - Life's own colors darken, dance, and drift around the Vision in the making. - Shudders rise and rumble, and the delerious savor of these effects clashing with the deadly hissings and the hoarse music that the world, far behind us, hurls at our mother of beauty, - she recoils, she rears up. Oh, our bones are clothed with an amorous new body.

x x x .

O the ashy faces, the crined escutcheon, the crystal arms! the cannon on which I am to fall in the melee of trees and of light air!

Post Scriptum

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-48382010000100005
As propostas teóricas de Winnicott ([1951] 1975) sobre o brincar e o viver criativo enunciam estes conceitos vinculados a uma teoria de amadurecimento que tem como centro a questão da necessidade de uma experiência concreta e contínua de relação com um ambiente facilitador, no início da vida, para que o sujeito em construção vá podendo gradativamente se transformar em "um ser que experimenta a si mesmo", na integração das diferentes dimensões do self (psique, soma e mente), tornando-se capaz de viver criativamente dentro das imposições da realidade externa.

No que se refere às origens da criatividade, Winnicott aponta que, nas tentativas de abordagem da questão empreendidas pela psicanálise, perdeu-se de vista em grande parte o tema principal, tendo-se privilegiado apenas "observações secundárias e terciárias em detrimento do que poderia se chamar de primário" (Winnicott, [1971] 1975: 100). O autor ressalta que o tema principal é o do próprio impulso criativo que, embora não possa ser explicado, pode ser relacionado ao viver propriamente dito. Uma original concepção de agressividade, o conceito de espaço transicional e o conceito de uso de um objeto constituem pontos essenciais na obra de Winnicott para a compreensão da questão da criatividade e nos parecem permitir um diálogo com a concepção de teatro abordada neste trabalho.

A agressividade constitui um tema que Winnicott abordou em diferentes momentos de sua obra, dando-lhe um status inovador em relação às concepções clássicas da psicanálise. Tomando como ponto de partida de seu pensamento as contribuições de Freud e Melanie Klein, Winnicott reconhece a importância de propostas destes autores, como a ideia de fusão dos impulsos eróticos e destrutivos, mas recusa a ideia de uma pulsão de morte. Porém a sua originalidade está em postular a existência de uma agressividade primária que se confunde com o movimento da própria vida. Sua concepção de amadurecimento implica a ideia de que, sendo o ambiente favorável, o bebê caminha na direção de uma integração psicossomática, tornando-se cada vez mais potente e necessitando cada vez mais experimentar sua força, lidando com uma crescente capacidade de reconhecer acontecimentos e objetos.

Ao refletir sobre o desenvolvimento afetivo primário, Winnicott ([1945] 1969) observa que durante os estágios iniciais o bebê passa por um estágio de "impiedade primitiva". As manifestações ditas "agressivas" (o comer, o devorar, o morder) são exercidas nos momentos de excitação:

a coisa importante a assinalar a respeito dessa agressividade instintual é que embora cedo se torne algo que possa ser mobilizado a serviço do ódio, é originariamente parte do apetite, ou de alguma forma do amor instintivo. É algo que aumenta durante a excitação e seu exercício é altamente prazeroso (Winnicott, [1945] 1969: 45).
Estas manifestações apresentam-se "sem compaixão" (ruthless) em função da imaturidade do bebê, que não lhe permite avaliar as consequências dos seus atos espontâneos:
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no teatro da crueldade, a primazia será da encenação e dos atores. Os espectadores não serão separados, estão no centro da cena, enquanto a encenação se dará ao redor. A linguagem teatral deve abandonar o predomínio da palavra, do diálogo, da linguagem articulada. A linguagem deve se materializar no próprio espaço, nos objetos, nos sons. Deve ser recolocada no próprio corpo do ator não como uma palavra que representa um pensamento ou emoção, mas uma palavra encarnada, que se expressa como um gesto. O que deve prevalecer nesta palavra, mais do que sentidos, são encantações, imagens auditivas. Artaud não abandona a palavra, mas a esta é atribuído um novo sentido: "dar às palavras mais ou menos a mesma importância que têm nos sonhos" (Artaud, [1938] 1999: 107), como ele diz.

Trata-se de fazer do teatro uma função: ativar a sensibilidade, em tempos em que domina um entorpecimento geral, de modo que, "abalando as nossas representações, insufle-nos o magnetismo ardente das imagens e acabe por aqui sobre nós a exemplo de uma terapia da alma cuja passagem não se deverá esquecer" (Artaud, [1938] 1999: 96).

O teatro é o único lugar do mundo e último meio de conjunto que nos resta para alcançar diretamente o organismo e, nos momentos de neurose e baixa sensualidade como este em que estamos mergulhados, para atacar essa baixa sensualidade através dos meios físicos aos quais ela não resistirá (Artaud, [1938] 1999: 91).

Como se pode ver nesta passagem, a crueldade relaciona-se diretamente à noção de ato e gesto. Desmontada a soberania do texto, o teatro estaria livre para ser abordado da perspectiva do ator, aquele que age. O ator se exercita e treina para aprimorar seus reflexos, ou seja, ativar e dilatar seu potencial de expressão e reação a um determinado estímulo. De nada vale o pensamento, ou a emoção não manifesta. Interiorizados, o pensamento e a emoção só teriam um caminho: enquanto impulsos que determinam um gesto, uma expressão imediata, pois "é no palco que se reconstitui a união do pensamento, do gesto, do ato" (Artaud, [1938] 1999: 91). Ou ainda:

Para quem se esqueceu do poder comunicativo e do mimetismo mágico do gesto o teatro pode reensiná-lo, porque um gesto traz consigo sua força e porque de qualquer modo há no teatro seres humanos para manifestar a força do gesto feito (Artaud, [1938] 1999: 91).


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