quarta-feira, 3 de abril de 2019

É A ECONOMIA, ESTÚPIDOS!


Como era previsível, o Executivo anunciou que seu plano de governo tinha condições de resolver em profundidade os impasses e as dificuldades enfrentados pelo conjunto da sociedade brasileira. Essa ambiciosa proposta, denominada de Plano Trienal de desenvolvimento econômico-social: 1963-1965, foi elaborada pelo renomado e respeitado economista Celso Furtado (Ministro do Planejamento), com a colaboração do jurista e professor San Thiago Dantas (Ministro da Fazenda).
De início, assinale-se que a composição do primeiro ministério presidencialista de Goulart revelaria de forma muito expressiva as ambigüidades, as limitações e o estilo conciliador que predominariam durante todo o governo. No ministério encontravam-se políticos conservadores do PSD, petebistas "fisiológicos" e "nacionalistas" e militares dos setores "duros". O Ministério era, assim, a expressão dos difíceis compromissos assumidos por Goulart para tomar posse: conciliar nacionalistas radicais e setores conservadores além de reformistas, anti-reformistas e simpatizantes socialistas.
Plano Trienal procurava compatibilizar o combate ao surto inflacionário com uma política de desenvolvimento que permitisse ao país retomar as taxas de crescimento semelhantes às do final dos anos 50. Como reconheciam alguns setores de esquerda, o Plano constituía-se num avanço em relação às teses ortodoxas dominantes, pois afirmava ser possível combater o processo inflacionário sem sacrificar o desenvolvimento. Apesar de não atribuir aos salários efeitos inflacionários, na prática, o Plano pedia – como todos os planos de "salvação nacional" – que os trabalhadores (novamente) "apertassem os cintos", em nome de benefícios que viriam obter a médio e a longo prazo. Os tradicionais apelos à "colaboração" e ao "patriotismo" da classe trabalhadora eram reiterados pelos formuladores do Plano.
Inicialmente, os empresários industriais saudaram a proposta governamental; mas esta sofreria os seus primeiros (e fortes) abalos com os protestos vindos dos setores sindicais e das organizações nacionalistas e de esquerda. Logo nos primeiros dias de fevereiro, o CGT difundia um manifesto em que se denunciava o "caráter reacionário" do plano do governo Goulart. As críticas se aprofundaram a partir do momento em que as conseqüências da política de eliminação de subsídios ao trigo e ao petróleo começaram a ter efeitos sobre os salários das classes populares. CGT, PUA, FPN, UNE e o "grupo nacionalista" do PTB se unem na condenação do Plano Trienal de Furtado e Dantas.
O caso da tentativa de compra da American Foreign Power – Amforp veio comprometer ainda mais a imagem do chamado governo nacionalista. Ao mesmo tempo em que retirava os subsídios para o trigo e o petróleo e cortava investimentos públicos, o governo anunciou que estava prestes a adquirir, por 188 milhões de dólares, doze usinas do setor de energia elétrica norte-americanas. Visivelmente Jango cedia às pressões do governo dos Estados Unidos ao adquirir um autêntico "ferro-velho", como alguns técnicos e burocratas da própria administração federal viriam esclarecer. Tratava-se, assim, de uma "verdadeira negociata" em curso. Diante da grave acusação de "crime de lesa-pátria", por parte da esquerda nacionalista, o governo recuou. (Meses mais tarde, a Amforp seria adquirida por iniciativa do governo de Castelo Branco.)
Ao findar o ano de 1963, o malogro do Plano Trienal era reconhecido por todos: não ocorreu nem desaceleração da inflação nem aceleração do crescimento. Houve, sim, inflação sem crescimento.

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